sábado, maio 03, 2008

Nascer sem pais ou pra que pais?

Em uma aula larguei a seguinte frase:
- A gente devia nascer sem pais!

Pois bem, não sem progenitores, mas sem a relação claustrofóbica que por vezes as pessoas identificam com o papel dos pais ao longo da vida dos filhos.
Adoro os meus pais, profundamente!
Acho que são pessoas admiráveis, exemplo de dignidade na vida!
Mas por vezes sufocam com tanto zelo, com tanta sugestão, tanto conselho...
Talvez isso seja resultado de minha situação: mulher adulta ainda morando com os pais... Talvez não, com certeza também é isso!
Também porque é também um monte de outras coisas junto.

Me parece que os pais, que são responsáveis pelos filhos na infância (momento no qual realmente precisamos que eles nos dêem suporte), quando se aproveitam de padrões antigos de paternidade (aquele em que os pais enfiam cabeça do filho adentro todas as informações que ele precisa ter do mundo), acabam criando uma espécie de dependência desse papel durante os anos seguintes... eles não conseguem se dissociar dessa atitude de coordenador meio déspota que surge daí.
E na verdade, quanto menos precisamos deles, mais eles querem nos ajudar, numa reação de desespero ao se sentir um provedor inútil. (O que é pura bobagem, já que pais nunca serão inúteis!)

Explicando melhor, pra que todos compreendam minha linha de raciocínio: pais são provedores e gostam disso; se sentem importantes e úteis, recebendo todo o amor dos filhos em troca.
Então quando esse papel (de provedor) se torna supérfluo ou desnecessário (porque os filhos conseguem sozinhos o que querem e precisam) alguns pais se sentem perdidos e desamparados; e em pânico sufocam os filhos oferecendo o que não se precisa mais.

Pais também são importantes na vida adulta de um filho, mas de uma outra forma. É uma relação diferente, que precisa ser reinventada pra dar conta das mudanças ocorridas com o tempo.

Quando os pais estão velhinhos por exemplo... filhos se tornam muito mais pais de seus pais... e pais se tornam geralmente filhos rebeldes de seus filhos (pq não aceitam as mudanças que o tempo impõe)!


Relações interpessoais não são estanques, imutáveis, incorruptíveis!
Relações precisam ser atualizadas pelas pessoas pra continuarem sendo relações prazerosas e gratificantes, do contrário tornam-se prisões.
Isso serve pra todo tipo de relação!
Um exemplo bem bobo pra provar minha hipótese:
O que é uma relação? (isso no geral, incluindo objetos inanimados)
Relação é uma ligação que se estabelece, uma conexão, algo que liga dois ou mais pontos, digamos assim.
O que faz uma relação existir é esse traço em comum, exatamente a conexão.
Quando um dos pontos varia, muda de posição, ou de forma, ou interesse, a relação vai se manter se o outro ponto conseguir se manter conectado a essa variação, posição, forma, interesse. Caso o segundo ponto insista em se manter fixo, imóvel, com a mesma forma ou interesse, a relação se enfraquece, podendo tornar-se nula.

É o que acontece em muitos casamentos, em muitas famílias e em muitos círculos de amizade.
Não que se deixe de amar, mas a conexão se enfraquece e se não nos atualizamos a relação morre.
Um namoro pode se transformar numa profunda amizade e o amor é mantido, a relação se mantém, a conexão permanece - de uma outra forma, uma maneira atualizada, que ainda conecta e liga os dois pontos!
Uma relação de autoridade entre pais e filhos, pode muito bem tornar-se também relação de amizade, de troca - onde ambos os lados se realizam plenamente!

É tolice se prender aos papéis socialmente impostos por uma visão que restringe as relações.

Antigamente se acreditava que era possível achar um conceito que abarcasse toda a existência de alguma coisa, um conceito imutável para qualidades imutáveis.
Mas tudo isso caiu por terra! Se sabe que nós mesmos somos feitos de uma coleção de micro bichinhos e estamos em ligação com todo o universo - somos relação também!
Então pra quê insistir em modos de interação que não fazem mais sentido??
Vamos atualizar nossas relações e não só nossos cadernos!
Um discurso torna-se vazio se não existe uma ação dentro dele.
Verborragia é estagnação, e para um mundo que é movimento isso é suicídio!

(tá, pode ser meio forte... mas acho que é por aí!)

:)

Um comentário:

Alexandra Dias disse...

oi
deixei um link pro teu post da Simone de Beauvoir lá no www.cursodegurias.blogspot.com
bjs
Tõ adorando teus escritos!